16 de janeiro de 2012

Sobre os sebos, e as bibliotecas, e as páginas, e as pessoas e as letras.

Postado por V, às 18:26
Não sou uma pessoa que frequenta bibliotecas e sebos, não me simpatizo muito com livros antigos. Na verdade, nunca fui em uma biblioteca, talvez por medo de querer morar em uma delas e roubar o emprego da bibliotecária só para ter a desculpa para ficar enfiada nas prateleiras de livros, com o cheiro daquelas páginas mais velha do que eu, e tentando decifrar as lombadas já apagadas do tempo.
Eu sou muito apegada a livros. Acho que a qualquer um que eu já tenha posto a mão e lembre o título, ou a capa. Não sei quando foi que eu descobri que livros eram mesmo tudo o que me importa nessa vida, mas foi cedo. Me lembro que na pré-escola, as "tias" faziam as crianças do Jardim II levarem livrinhos na sexta-feira para devolver na segunda. Elas sabiam que as crianças liam os livros por que, se não me falha a memória, ela perguntavam o que acontecia na história. E lembro que eu queria muito ler "Maria-Vai-Com-As-Outras". Mas eu nunca conseguia chegar na caixinha antes das outras crianças, então demorei bastante tempo para ler esse livro. Os outros não me lembro o título ou a história, mas esse lembro até das leigas ilustrações. Acho que foi aí que minha relação com os livros começou. Mas era coisa de pré-escola. Eu tinha 5 anos, e achava de um livros de 30 páginas era uma bíblia.
Com ou oito sete anos, eu tive uma cunhada e ela sempre me falava de alguns livros. Ela me trouxe dois, "Minha Primeira Paixão", que é um dos meus livros preferidos até hoje, mas nunca achei para vender e "O Diabo se Diverte" (não é brincadeira quando eu digo que tenho gosto pelo outro lado desde criança, nunca fui normal nesses aspectos), que até hoje eu não concluí a leitura, pois na época minha mãe achava um absurdo uma criança de 7 ou 8 anos e algo sobre o Diabo. Minha irmã achava ótimo, eu estava lendo, afinal, e era um livro que as escolas mesmas distribuíam. Mas nunca o achei de novo.
E foi bem nessa época em que eu escrevi meus primeiros contos. Coisinhas bobinhas para a escola, mas minha professora achava super pra frentex. Da primeira a quarta série eu costumava ser a aluna escritora da escola. Lembro de um livrinho que as professoras fizeram no final da primeira série e a ordem dos contos seria por notas. O meu era o primeiro. Foi aí que eu descobri que gostava de escrever. Pensem, uma criança de sete anos já sonhando que iria escrever livros. Era eu. Na terceira série eu comecei a escrever poesias. Coisinhas bobas, mas eu achava que era bom. Minha professora achava que era bom. Perdi todas ao longo dos anos, mas adorava escrever elas. Gostaria de poder reler algumas. Na quarta série tínhamos que fazer uma poesia sobre o dia das mães. Eu fiz a minha como quem só quer entregar a tarefa. Acabou que eu tive que ler a coisa em frente a todas as mães que foram para a apresentação do dia. Esse foi a primeiro dia em que eu expus minha escrita para mais do que duas pessoas. Eu tinha 10 anos e já me preocupava se as pessoas iriam gostar ou não.
Na quinta série eu era uma idiota. Mas pelo menos tinha uma professora de leitura que incentivava as crianças a ler. Mas eu achava isso tão chato, que não me preocupava. Na sexta eu passei a odiar a ideia de dividir a classe com as pseudo-levianas  de 12 anos que adoravam sair por ai dizendo que já era parcialmente desvirginadas. E essa mesma professora um dia pediu para que escrevêssemos sobre o que achávamos da escola, dos alunos. Eu fui curta e grossa no assunto: "os professores são uns coitados, que tentam colocar alguma coisa na cabeça desses seres humanos que deveriam formar o país do futuro, mas estão mais qualificados para formarem a cadeia de hoje, já que é difícil sobreviverem até amanhã", ou coisa assim. Isso com 12 anos. A professora adorou meu textos e minhas críticas. E foi bem perto da reunião de pais do meio do ano, onde todo professor já não aguenta mais nenhum aluno. Ela me pediu permissão para expor o texto para os pais de todas as classes que comparecessem na reunião, já que os professores tinham adorado. Foi também, nesse ano, em que li A Saga Crepúsculo, e lembrei que amo vampiros. Li também "A Cabana", livro do qual não surtiu o efeito que surte em muitas pessoas e "Chuva de Novembro", um dos raros 3 livros nacionais dos quais eu adoraria ter na estante. Foi aí também, que começou minha história de amor pelo Dan Brown e as aventuras de Langodon, e quando eu descobri que gostava de história européia.
Foi graças a essa professora que ninguém gostava, nem mesmo eu, por que eu achava bem chato ficar na micro biblioteca lendo contos de fadas, que eu conheci os Irmãos Grimm. Eu mal sabiam que eles eram até essa época, e achava que os contos de fadas, dos quais eu nunca assisti, eram obra a Disney. E quando eu digo que cultura está em todos lugar, e são as pessoas que renunciam à ela, não é brincadeira.
Na sétima série escrevi meu primeiro conto psicológico, do qual ninguém nunca leu, é quase perturbador dizer que foi escrito por uma garota, ainda mais de 13 anos. E comecei meu pseudo-livro do qual até hoje não terminei. E quando bati a invejável (por mim, claro) meta de 37 livros lidos. Jamais conseguirei o feitio novamente. Foi assim que eu comecei a sair do mundo real e comecei a visitar novas histórias, novos sentimentos, novos mundos apenas com as palavras. Tanto as minhas, quanto as de outras pessoas.
Mas, falando de algo atual, hoje eu entrei no meu primeiro sebo. Conhecia alguns só pelas vitrines, de livros que eu já havia lido e não me interessava em ler novamente. Mas esse me chamou atenção pela linda capa de "A Mão Esquerda de Deus", descobri recentemente um fascínio por essa obra. Pedi para minha mãe que passássemos nesse sebo, pois eu queria saber se poderia desenterrar uma caixa enorme de livros que eu tenho no guarda-roupas e trocar por livros novos, dos quais quero muito mesmo ler. Acabei somente olhando algumas lombadas, em busca de algo que me interessasse, e encontrei títulos que há muito queria ter lido, mas meu pai achou que era caro demais gastar noventa reais em uma coleção de livros.
Minha mãe disse uma só frase, que fez com que eu me sentisse ainda melhor naquele lugar: "Esse lugar tem amiguinhos". "Amiguinhos" é a definição para "espíritos" que usamos aqui em casa. Minha mãe é sensitiva, e vocês devem me achar maluca por me sentir bem em um lugar com "amiguinhos". Mas são amiguinhos como eu. Que estão presos à algumas páginas de um livro qualquer. Existe um pouco da vida terrena desses amiguinhos em algumas lombadas e em alguns trechos, dos quais eles conseguiam se encontrar e se entender enquanto estavam com os livros abertos. Isso me levou direto para o enredo de "A Sombra do Vento" e "O Jogo do Anjo", um dos quais estava, ironicamente, exposto no balcão-vitrine do local. Me lembro vagamente de algum devaneio do personagem Sempere em que ele filosofa (desculpe, não acho palavra melhor) sobre como as almas das pessoas apaixonadas pelas histórias ficam presas nos livros quando elas morrem. Vai de pessoa para pessoa acreditar em algo assim. Eu acredito que em todos os livros de bibliotecas e sebos, exista uma pequena parte não somente de quem leu, mas também de quem escreveu. Tentei imaginar o tanto de amiguinhos que não existem nas biblioteca pelo mundo a fora.
"Um escritor não morre quando o coração pára. Um escritor morre somente quando seu último romance é fechado esquecido em alguma prateleira de alguma biblioteca. Antes desse dia, ele continua vivo em suas páginas" é mais ou menos a mensagem que o trecho do livro quer nos passar.
Deixando essa parte desagradável para alguns de lado, me senti estranhamente "em casa" dentro daquele sebo. Mesmo achando apenas dois ou três títulos dos quais eu leria, sinto que voltarei naquele lugar somente para buscar a razão pela qual entrei ali e mais um livrinho ou dois ridiculamente barato. E não com a minha mãe, não quero que ela se perturbe com pessoas como eu, que nunca se desprendem das letras.

Demorei bem mais do que pretendia escrevendo isso, falei bem mais do que esperava falar, mas é somente para que as pessoas entendam um pouco mais essa minha fascinação pelas letras.

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